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FEIRAS - BIENAIS E EVENTOS REVISTA LITERATURA 

Raízes, Leitura e Resistência: a Feira de Saquarema que transforma páginas em ação

Na charmosa cidade litorânea, uma feira literária assume um papel que vai muito além das bancas e sessões de autógrafos: converte palavras em movimento social. A mais recente edição do evento celebra visibilização e diversidade, ao mesmo tempo que abraça temas urgentes como meio ambiente, saberes tradicionais e a pluralidade de vozes negras e indígenas.

Sob o pano de fundo de uma proposta que dialoga com a urgência da sustentabilidade, a feira posiciona a literatura como ferramenta de transformação. O universo editorial se mistura ao ativismo: mesas de debate abordam desde a “escrevivência” como forma de resistência até a poesia originária que resiste às margens da historiografia oficial. Autores reconhecidos dividem o palco com nomes emergentes, em um cenário que prioriza trocas, escuta e construção coletiva.

O eixo da curadoria valoriza tanto a educação quanto a inclusão. A mobilização para formar novos leitores se faz concretamente visível: escolas são convidadas a participar, e os estudantes recebem estímulos que ultrapassam a simples visita à feira — ganham possibilidades reais de interação com quem escreve, toca e vive literatura. Esse diálogo direto entre público e autor reduz distâncias simbólicas e amplia práticas de leitura para além dos círculos literários tradicionais.

Um dos desdobramentos mais efetivos está na valorização dos saberes ancestrais. A presença de escritores indígenas e afro-descendentes ocupa posição central na programação, não como coadjuvantes, mas como protagonistas que relatam trajetórias, pertencimentos e memórias. O gesto editorial deixa, assim, de lado o paternalismo e, ao contrário, abre espaço para vozes que historicamente foram silenciadas. O evento funciona como palco de afirmação identitária e como laboratório de literatura expandida — que incorpora memória, corpo, território e ancestralidade.

A aposta na sustentabilidade é visível nas discussões que exploram a intersecção entre leitura, meio ambiente e futuro. A literatura deixa de ser apenas arte contemplativa para tornar-se instrumento crítico: reflexão sobre a crise climática, resistência cultural e preservação de ecossistemas ganham lugar ao lado de romances e antologias. Ao se posicionar nesse ponto de convergência, a feira reafirma que ler é também agir — e que a palavra escrita interage com o mundo tangível.

Além disso, o caráter gratuito da iniciativa sinaliza um compromisso com a democratização da cultura. A entrada livre e os formatos acessíveis elevam o evento a uma experiência aberta, onde o livro não é tratado como objeto de consumo exclusivo, mas como parte de uma rede social comunitária. Quando o público cruza o portão, ele não apenas entra em contato com títulos variados, mas com um universo de diálogos, afetos e ativismos.

Se a cidade escolheu abrigar tal celebração, é porque reconhece que a literatura pode ser catalisadora de mudança — individual e coletiva. A feira oferece mais do que lançamentos e autógrafos: propõe que cada livro se torne um encontro, um gesto de construção, um sopro de resistência. Num país em que cada página ainda tem força de revolução, esse evento mostra que ler — de fato — é abrir-se para o mundo, para suas dores, suas esperanças e suas possibilidades reais.
E, ao final, resta a certeza de que literatura e transformação caminham lado a lado, fôlego a fôlego, verso a verso.

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